na corda bamba lendo imagens e escrevendo bobagens

Mas qualquer imagem pode ser lida? Ou, pelo menos, podemos criar uma leitura para qualquer imagem? E, se for assim, toda imagem encerra uma cifra simplesmente porque ela parece a nós, seus espectadores, um sistema autossuficiente de signos e regras? Qualquer imagem admite tradução em uma linguagem compreensível, revelando ao espectador aquilo que podemos chamar de Narrativa da imagem, com N maiúsculo?

o texto acima é de alberto manguel, em seu livro lendo imagens. manguel é um daqueles intelectuais que chegam a dar raiva de tanta sabedoria e erudição, pela particularidade de seus pontos de vista e principalmente, de sua capacidade de fazer conexões entre mundos aparentemente muito distantes. em lendo imagens ele analisa obras tão distintas quanto as da fotógrafa tina modotti, de aleijadinho ou um retrato de uma menina com a rara doença que a deixava com o rosto coberto de pelos, pintado por lavínia fontana na itália do século 16. corram pra biblioteca ou pra livraria. mas antes, fiquem com as minhas leituras de imagens. toscas, tortas e cheias de bobagens!

James DEAN e Ronald REAGAN em cena, 1954

É tarde da noite e um jovem invade a casa de um médico para que este socorra seu amigo baleado. O médico insiste em chamar a polícia mas o jovem mostra um revolver e o obriga, junto com sua mulher que detesta sangue, à cuidarem do ferido. A ação toda dura pouco menos de trinta minutos e foi gravada no Teatro General Electric de Nova Iorque em 1954. O médico foi interpretado por Ronald Reagan e James Dean fez o jovem que tenta salvar seu amigo. Sempre que vejo este still de The Dark, Dark Hours, eu fico imaginando o quanto seria bom se numa dimensão paralela, numa vida real fora das telas, numa vida com final feliz, o símbolo maior da rebeldia sem causa acertasse um teco nos cornos do maior símbolo do mundo capitalista neoliberal. Certamente estaríamos vivendo em um mundo diferente, um tantinho melhor. Se eu pudesse fazer uma versão de Back to the Future, seria para isto.

oscarito e brizola a chanchada e a legalidade

Quando vejo esta foto do Oscarito com Brizola, tirada no início dos anos 60, eu penso no quanto de simbolismo que cabe no encontro destas duas figuras tão diferentes e tão populares. Qualquer projeto de Brasil precisa, mesmo hoje em dia, ter um pouco destes dois no estatuto.

muppet show e debbie harry

Uma vez tive um ataque de riso que durou quase meia hora, eu simplesmente não conseguia parar de rir depois de ver um esquete da selvagem rosa irlandesa. dona cármina chegou a cogitar em me levar pro salgado filho. muppet show é felicidade garantida. debbie harry, rita moreno, johnny cash, elton john, harry belafonte, alice cooper e mais uma penca de celebridades davam as caras por lá.

gena rowlands é gloria

se debbie harry é a loura boazinha com pinta de malvada, gena rowlands é a loura malvada com cara de boazinha. quando vi o filme num corujão da tv, não sabia nada sobre john cassavetes, mas sabia o bastante pra perceber que estava vendo um filme bom pacas! gloria mostra uma nova iorque pardieiro, de ruas sujas, perigosas e nada glamorosas. uma cidade falida e dominada por gangsters e mafiosos. parece familiar?

tati

as férias de mr.hulot tinha entrado em cartaz no cine avenida e meu pai praticamente me obrigou à assistir. quando voltei pra casa, para decepção dele, tinha achado meio chato. chato é ser adolescente! seu francisco insistiu, me levou pra ver meu tio, quando este passou não lembro onde. a cena dos meninos jogando pedrinhas nos adultos que passam pela rua é coisa de gênio e jacques tati, foi um gênio. gênio como diretor, porque sabia como ninguém contar uma história com pouquíssimas palavras. porque sabia como ninguém usar o som para ajudar a contar uma história. porque criava e desenhava a maior parte dos cenários de seus filmes. porque se recusava a se integrar num mundo que não lhe dizia mais nada, porque sabia que as mudanças trazidas pela modernidade em paris, sua cidade, não eram necessariamente positivas. jacques tati e a imagem do tio levando o sobrinho na bicicleta nunca mais saíram da minha vida.

cine baltimore, porto alegre

fui cedo pro alaska, tomei muitos chopes e muitas batidinhas de coco. fumei um na calçada da oswaldo aranha até chegar no baltimore lotado pra exibição de jesus cristo superstar. sentei no chão, perto da tela, achei tudo muito chato e com menos de 10 minutos de filme vomitei na guria que estava ao meu lado. nem deu tempo de ouvir os xingamentos. levantei correndo e fui embora.

censurado na estreia em nova iorque, censurado no brasil pela ditadura, o império dos sentidos foi finalmente liberado com a assinatura da dona solange em 1982. mas o barulho da imprensa foi tanto que os bilheteiros estavam agindo como se fossem porteiros de boate. fui até a porta do baltimore com a minha namorada e um amigo que tava muito a fim da minha namorada. não consegui entrar na sessão do império dos sentidos. eu tinha 17, a namorada e o amigo já eram di maior e passaram pela roleta. depois do filme foram se comer. ser di menor é uma merda. nunca assisti o império dos sentidos. mesmo quando virei di maior. mesmo quando meu amigo guilherme kato me emprestou o dvd.

caminho pro santos dumont

inútil paisagem. paisagem útil. paisagem é verba. morei quase 30 anos no rio de janeiro. devo ter pisado somente umas duas vezes nas areias da praia de botafogo. e assim mesmo, porque estava trabalhando. tirei esta foto centena de vezes, sempre que ia cedo pro santos dumont. o antropólogo Claude Lévi-Strauss detestou a Baía de Guanabara. Pareceu-lhe uma boca banguela Devia estar com os ovos virados.

cine 23 y 12

em 2004 meu filme carrapateira não tem mais ciúmes da apolo 11 foi selecionado para o festival de cinema de havana. beleza! lá fui eu para cuba, com fidel nos finalmentes, mas ainda em campo. já tinha ouvido diversos relatos emocionantes sobre as sessões lotadas, da euforia cubana nos cinemas e a empolgação geral do povo com o festival. como faço documentários e torço pro botafogo, minhas expectativas nunca são muito altas. mas os camaradas da organização do festival capricharam nas baixas expectativas. programaram a exibição do meu filme para um sábado, 10 da manhã. e pra completar, choveu pacas naquele dia. a bela e gigante sala do cine 23 y 12 teve, além de mim, um solitário espectador. lembrei da frustação de um diretor americano no riocine de 1992, com a sala vazia no ccbb para a exibição de seu trabalho. não lembro o nome nem do diretor e nem do filme, mas lembro que o cara transformou um trecho de 1 minuto de uma cena do bonde de são francisco, filmada nos anos 20, em quase 90 minutos de projeção! eu estava na produção do festival e tive que lidar com a fúria daquele pacato senhor, que mais parecia um escriturário, reclamando da energia dispendida entre a califórnia e a guanabara para resultar numa sala vazia…deprimido na porta do cine 23 y 12, resolvi andar pela chuva em havana. andar na chuva em havana cura qualquer depressão. e naquele ano, vi pelo menos 3 filmes inesquecíveis, em sessões lotadas e catárticas: soy cuba, o mamute siberiano, do meu chapa de tv educativa, vicente ferraz, machucca, do chileno andres wood e o uruguaio whisky, da dupla pablo rebella e pablo stoll.

estação sumaré

pra quem está chegando em são paulo: uma boa maneira de conhecer e entender a cidade é andando de metrô. obviamente, não vemos muito a paisagem…mas vemos gente pra caramba! e vemos a cidade nestas gentes! algumas estações nos pegam de surpresa com a luz do céu (santos-imigrantes, armênia, tietê) e esta, a do sumaré, que conta com 22 painéis fotografias-poemas feitas por alex flemming. a sensação de passar por esta estação é sempre boa. é como se a gente visse da janela, a cara das gentes que estão do lado de dentro, no vagão do metrô.

pintura de vania mignone
girls viktor chemso urss 1965

conheci o trabalho de vania mignone numa ida ao mac-usp em 2013. pop, pero no mucho. figurativo: também, mas não totalmente realista. feminino e feminista: certamente. mas nada disto importa. o que vale é que a pintura da vania me pegou de primeira. assim como a tela girls, do viktor chemso, um russo que não tem conexão nenhuma com a vania, que é de campinas. e nesta imagem, que descobri no facebook, na página do soviet visuals, a associação entre o trabalho dos dois foi imediata

túnel

antonio tinha quatro ou cinco anos quando resolveu usar seu tênis rasgado como túnel na sua pista de hot wheels. não preciso escrever nada sobre isto!

é isto macacada! NA CORDA BAMBA conta com vocês! assinem, leiam, divulguem, compartilhem. PAZ! e PIX: fabpmaciel@gmail.com

LINKS! LINKS E MAIS LINKS!

sobre alberto manguel: https://www.companhiadasletras.com.br/colaborador/00309/alberto-manguel

manguel participou de meu documentário Galáxias, de 2013. no link um texto do luis nassif no seu ggn: https://jornalggn.com.br/noticia/o-documentario-galaxias-de-fernando-maciel-e-fahrenheit-451/

e o teaser de galáxias: https://vimeo.com/manage/videos/111980444

the dark, dark hours: https://www.youtube.com/watch?v=wzVdx-HTPDI

oscarito com jô soares em o homem do sputnik

alguns filmes que brincam com a volta ao passado para resolver o presente e o futuro: back to the future, o exterminador do futuro e o meu favorito: barbosa, de jorge furtado.

my wild irish rose no muppet show:

debbie harry no muppet show!

a participação de rita moreno também é simplesmente sensacional

o trailer de glória:

o trailer de meu tio:

o trailer americano de o império dos sentidos:

o clip de o estrangeiro:

o trailer de soy cuba, o mamute siberiano, de vicente ferraz:

tem um livro com as fotos da estação sumaré: https://livrosdefotografia.org/publicacao/33972/estacao-sumare

vania mignone: https://www.casatriangulo.com/pt/artists/47-vania-mignone/

soviet visuals: https://www.facebook.com/sovietvisuals

viktor chemso: http://chemso.ru/viktor_chemso.html

e nos 44 do segundo tempo achei esta versão brasileira para a música de meu tio:

Uma resposta para “na corda bamba lendo imagens e escrevendo bobagens”.

  1. Avatar de katoregina
    katoregina

    Cada dia mais sensacional!

Deixe um comentário