na corda bamba e todas as faxinas de amor são ridículas

A frase é de Fernão Kiboa, bandeirante de vassoura, diarista nas horas muito vagas e pensador motivacional de quinta categoria e já que estamos no modo coach de ser, me mostrem um pensador motivacional que não seja de quinta. Outro Fernando, o Pessoa escreveu que todas as cartas de amor são ridículas e estava cheio de razão, assim como também estava o Dalton Trevisan que escreveu A Guerra Conjugal e o Glauco, que desenhou e escreveu as tiras do Casal Neuras. Entre o ridículo das cartas, das guerras e das neuras conjugais, eu consegui a façanha suprema de meter os pés pelas mãos: quebrei o dedo mindinho do pé ao bater na quina de um móvel, mais precisamente no oratório onde estão todos os santos que tentam de alguma forma proteger esta casa (trabalham pacas, aliás). O supremo de frango do ridículo foi que a topada rolou durante uma faxina e a faxina rolou depois de uma DR, portanto só posso dizer que nada, mas absolutamente nada é mais ridículo do que uma faxina de amor! Na Corda Bamba 51 está na rede. Mandem mensagens de amor pelo pix: fabpmaciel@gmail.com Este tipo de mensagem nunca cai no ridículo.

E como agora vou ter que ficar a maior parte do tempo com a perna pra cima, vou começar escrevendo sobre uma das coisas que mais gosto de fazer: caminhar. Caminhadas servem para pensar na vida. Servem para pensar besteira. Servem para perder a barriga. E pra quem bebe alguns copos depois da caminhada, serve para equilibrar o lance e deixar tudo como estava antes: balançando. Caminhar à toa é o melhor de todos os esportes. Flanar como no poema do João do Rio em A alma encantadora das ruas. Flanar como um desocupado ou como quem está com a vida ganha, mesmo que a vida esteja pra lá de perdida. Caminhar nas ruas, pelas estradas tô fora, não tenho vocação nem coragem pra andarilho. Caminhando e cantando e seguindo a canção com os fones no ouvido, caminhando sozinho, não somos iguais e não estamos de braços dados com ninguém e estamos cansados de esperar por tudo. Caminhar por desespero, como numa das minhas muitas fases de dureza, e eu morava no Rio, no Jardim Botânico e um grande amigo tinha morrido e eu comecei a ver o cara no outro lado da pista da Lagoa enquanto caminhava. Numa tarde de caminhada resolvi entrar na igreja de vidro que fica perto do Hospital da Lagoa, a igreja de São José. Um padre velhinho estava por ali e puxou conversa. Resolvi contar das caminhadas e do amigo que tinha partido e que pelo jeito, não queria subir. O padre não pensou muito, me levou para uma sala, pegou um aspersório e começou a me benzer, jogando água benta em mim e dizendo com seu sotaque lusitano, sinhoire, tiri esstiss diabinhus do corpo dessti homem, tiri, tiri, tiri, vade…macumbeiro não recusa reza e benza de ninguém. Nunca mais vi meu amigo na Lagoa e arrumei um emprego naquela mesma semana. Salve, salve Wiliam Friedkin. Quem é ateu e vê milagres como eu, minha amiga inglesa jornalista da bibici, nunca conseguiu entender: como fabiano, acreditar na ciência, na luta de classes e no marxismo e no mumbo jumbo?!? Taí a graça de ser brasileiro. Mas não precisa ser latino pra acreditar que caminhadas podem salvar alguma coisa.

No inverno de 1974, ao ficar sabendo que Lotte Eisner, a mais importante historiadora do cinema alemão estava para morrer, o cineasta Werner Herzog partiu a pé de Munique para Paris, munido somente de uma bússola e uma mochila, numa caminhada penitência que durou três semanas. A caminhada obviamente não salvou Lotte, mas gerou um livro surpreendente, tão fascinante quanto os relatos dos viajantes do descobrimento. Caminhando no Gelo é um anti-Compostela, um livro de descoberta que anda, caminha, vai e avança na contramão da turma catita e legal que peregrina de birkenstock e com carro de apoio do lado. Herzog fez uma caminhada procissão e ao mesmo tempo uma procissão happening, tipo bloco do eu sozinho. Não carregou uma cruz como o Zé do Burro, nem tentou pregar o evangelho como Santo Antônio, que era andarilho e era português como o padre da igreja da Lagoa, se chamava Fernando como o meu amigo que não queria subir e que por um destes acasos do destino, virou o santo casamenteiro, que arranja casamentos mas não faz milagres de impedir barracos domésticos ridículos.

quem olha pro chão de vez em quando pisa em são paulo

As palavras mais encontradas para quem caminha na rua Luis Góis, no bairro da Saúde, zona sul de São Paulo: Vende, vende-se, seguidas de aluga e aluga-se:

Na foto acima, o posto de gasolina que fechou e nunca virou mais nada. A pergunta é: existem mais carros circulando e muito menos postos de gasolina…

Mudas e mudanças. Até alguns meses atrás, atrás deste muro de madeira ficava uma casa velha, que tinha uma sankofa que o Antonio fotografou pro trabalho de escola. A casa e a sankofa já foram pro brejo. 

a casa demolida e a sankofa

Esta vai sumir em breve:

esta já sumiu

Esta outra casa aí embaixo, é do dono de meu restaurante preferido, a Robataria. Ele está tentando reaproveitar o máximo de material pra usar na próxima obra, que ele ainda não sabe, ou não quis contar o que vai ser.

O melhor negócio do bairro: salão de beleza. De todos os tipos e preços, para todos os gostos, numa média de 2 ou 3 por quadra, o que dá, vamos ver, a Luis Góis tem pelo menos umas trinta quadras… 

O pior negócio: reformar o que era originalmente moderno e transformar em algo “modernamente atual”. A casa moderna que ficou espelhada do lado da linda casa verde está para alugar desde antes da pandemia. 

o milagre da multiplicação dos donuts e um novo morador em cada esquina. 

A agência do Bradesco não tinha cerca. Vivia lotada e os moradores de rua podiam dormir na entrada. Agora a agência quase não tem movimento, os clientes não precisam mais passar pela porta giratória de segurança que foi abolida, mas os mendigos perderam seu canto. 

Esta casa meu pai construiu no final dos anos 50. Eu já avisei pros meus filhos, que eles só vão vender depois que eu morrer. Aqui tinha 4 carros, um impala, um jk. O jk era muito lindo, eu digo. lindo demais, depois, quando eu fui pra faculdade eu ganhei um alfa romeo. Este era mais bonito ainda, completei. Acho que o jk era uma cópia dele. isto! era uma beleza, tinha motor de 117 cavalos! O dono da casa deixou eu entrar pra fotografar um painel nativista com relevo, na garagem da casa onde antes estacionavam impalas, jks e alfinhas. A conversa foi animada e ele nem percebeu que as únicas marcas de carro que conheço são as da minha infância, que não tenho a mínima ideia do quanto anda um carro de 117 cavalos e que sequer tenho carteira de motorista. Mas a casa segue por ali, enquanto o antigo dono do alfinha estiver por aqui.

O bairro ainda abriga algumas casas bem simpáticas, e algumas mesmo desfiguradas, ainda guardam algum estilo :

E um resto de ar de interior ao lado de algumas novidades que eu nem sei o que achar.

A rua também tem prédios que não se chamam mariana hills ou green valley house ou ibirapuera gardens lake mountains office living fucking buildings! Este da foto é o Olavo Bilac e apesar do nome, tenho dúvida se os moradores, como direi, ouvem estrelas.

Logo que mudei pra cá, fui com a Miriam neste templo budista que tem pertinho de casa. A intenção era ouvir os cânticos dos monges. Fomos recebidos por um senhor que gastou o tempo todo da conversa tentando explicar que o Budismo japonês era o verdeiro budismo, o mais completo, com todas as reencarnações de Sidarta, e que qualquer outro budismo ancestral, na Índia ou na China era incompleto e portanto, não nos levaria ao Nirvana. Nunca mais demos as caras por lá. 

Por hoje é isto macacada! Fiquem com este belo close do meu pé esquerdo de papo pro ar. Antonio e Vicente estão eufóricos, papai não vai poder correr atrás da gente quando a gente pegar o celular dele! Pra não deixar barato, eu fico andando como o Marty Feldman no Jovem Frankestein e eles até acreditam que eu sou o Igor Corcunda e decrépito. Na foto da capa, o cavalo de pau, sugestão do Antonio pra eu usar como bengala em casa. Gênio! Beijos no pé. Paz. E Pix! E sim, a corda agradece muito a chegada de Indio Igreja (com a benção de Vera Gribel) e de Fernanda Balera!

LINKS! LINKS E MAIS LINKS!

Video que fiz com Fausto Fawcett numa versão para as cartas de amor do Fernando Pessoa: https://vimeo.com/116010563https://vimeo.com/116010563

Os primeiros parágrafos de guerra conjugal, de dalton trevisan,

https://www.camara.leg.br/radio/programas/536486-guerra-conjugal-de-dalton-trevisan/

uma tira do casal neuras do glauco:

Para baixar A alma encantadora das Ruas, do João do Rio

sobre a caminhada de herzog: http://www.contracampo.com.br/80/artmanualdevoo.htm

hermeto pascoal e a música pra santo antonio, com a introdução linda de dona Divina Eulália de Oliveira, explicando a procissão de Santo Antonio: https://www.youtube.com/watch?v=H_EhF57l4oM         

trailer de o ornitólogo, filme português, pra lá de bacana e inspirado muito livremente na vida de santo antonio:

operação frança, pra quem não quer perder tempo nem com santos e nem com exorcismos:

e os mutantes cantando caminhante noturno: