na corda bamba 149: páscoa, promessa, redenção, ressurreição e um ioiô da coca-cola

Uma das poucas coisas boas de se ter quase 60 anos nas costas é o total descompromisso com a novidade. Filme que foi lançado há cinco anos atrás, para mim é novo como se fosse da semana passada. Neste começo de feriado pascoalino 59 belezas, vi alguns que ainda não tinha visto e, por acaso, revi outro que já tinha visto algumas vezes… Por uma estranha sincronicidade temática, todos tratavam da vida, da morte, da luta pela sobrevivência, da ressurreição, de promessas (cumpridas ou não), de esperança e fé (ou a falta dela) na humanidade. Por uma estranha sincronicidade, conversei com meu amigo Tagore, o Krishnamurti de Pelotas by the sea e catarina up the hill, apocalíptico e desintegrado, que só acredita mesmo nos BRICS e no alinhamento astrológico e geopolítico do Lula com o Putin e com os arcanos chineses. No mais, é a crença na ciência e na sua boa execução. A técnica. O planejamento que não pode faiar. Fé e amor são para otimistas como eu. Pra cima e pra baixo eu vou. Ioiô. # Comecei com Triângulo da Tristeza, que faturou a Palma de Ouro de 2022. O diretor Ruben Ostlund é sueco e tem a mão pesada. Gosto de mão pesada. Os personagens despejam diálogos que parecem palavras de ordem, do mesmo modo como vomitam dicumforça no jantar de gala do cruzeiro dos milionários. Tem mulheres bonitas, ricos perdulários de todas as latitudes e muita escatologia. Começa com um desfile de moda lex luxor, com slogans “disruptivos” rolando no telão. Tipo aquelas mensagens por um mundo melhor escritas pelo depto de comunicação social, pra causar na convenção da empresa poluidora cheia de responsabilidade social. Num teste de elenco o diretor mostra como se deve caminhar com “atitude”. Explica que o “triângulo da tristeza” é a região entre as sobrancelhas, aquela que franzimos quando estamos nervosos, aquela que escancara nossos primeiros sinais de envelhecimento. É o primeiro sinal da morte que vai chegar. No fim das contas, não tem redenção pra ninguém. # Ontem também vi O Quarto ao Lado, o filme americano de Almodóvar. É bom envelhecer. Sem virar um bunda mole. Tá tudo lá: as mulheres espetaculares, lindas e plenas. Mesmo que elas tenham mais de 60 anos. E como elas estão lindas e plenas! Mesmo que uma delas esteja morrendo. Tem as cores vibrantes, apesar da paisagem outono-inverno. Tem uma música que lembra as trilhas de Bernard Herrmann pro Hitchcock. Num almoço numa varanda de frente para um lago bucólico, John Turturro diz para Julianne Moore que ainda que todos os poetas escrevessem um poema sobre a crise climática, isto não salvaria nenhuma árvore-Pelo menos as árvores te interessam- Sexo também me interessa…-Acha mesmo que a situação é tão desesperadora? -Sim, nada vai apressar mais o fim do planeta do que a sobrevivência do neoliberalismo e a ascensão da extrema direita.-Não pode sair por aí dizendo que não há esperança, Há muitas formas de se viver dentro de uma tragédia. # fé e esperança # O Quarto do Lado cita The Dead, o último conto de Dublinenses, o único livro do Joyce que realmente li. (Ulisses eu só enfeitei a prateleira). Também cita o filme inspirado no conto, Os vivos e os Mortos, o último que John Huston fez em sua espetacular vida e carreira. Sim, os jornais estavam certos, a neve era geral em toda Irlanda. # O sábado começou com O Pagador de Promessas. Também ganhou Cannes e pouco importa que não era cinema novo. Tudo é absurdamente belo neste filme de fotografia e enquadramentos impecáveis. Tá tudo na cartilha que Anselmo Duarte sabia de cor e salteado. Bem filmado, decupado, montado. Tá tudo lá. O que a Bahia poderia ter sido se o golpe não tivesse abortado o sonho. Iansã e Santa Bárbara. Juntas como dever ser. A promessa é paga com a vida e a cruz entra na igreja carregada pelas baianas e pelos capoeiras. Ontem: os padres não permitiam candomblé dentro da igreja. Hoje: fiéis não permitem candomblé dentro da igreja. Ioiô. # Em 1936 Capanema cancelou o concurso pro prédio do Ministério da Educação e Saúde. O projeto vencedor era horrível. Capanema tava cheio de razão. Em 1970, Paulo Mendes da Rocha projetou o pavilhão do Brasil na Feira de Osaka. O governo japonês gostou tanto que pediu pra não demolirem o prédio. Os militares negaram, não iam dar cartaz pra arquiteto comunista e proibido de exercer a profissão no país. Em 2025 Márcio Kogan fez um projeto bacanudo que ganhou o concurso da Apex pra feira. A Apex foi empurrando com a barriga, na hora h mandou um caô, disse que não dava mais tempo, que ia ficar caro, cancelou e colocou no lugar um caixote com neon – é o que aparenta a única foto que encontrei na rede – parece que por dentro é bia lessa legal. 90 anos depois mudamos a estratégia: por fora feia viola, por dentro cenário top top. Pra cima e pra baixo eu vou. Paisagem é verba. # Nos anos 30, quando Hitler visitou a Itália, Mussolini encomendou na Cinecittà cenários gigantes com tanques pintados. Os murais foram colocados ao longo do trajeto por onde o bigodinho iria passar. Como era grande a piroga do índio e as armas do Mussolini. Ioiô.# Paola Carosella disse que quem vota-apoia Bolsonaro ou é burro ou é escroto. Tem toda razão. A Jovem Pan chiou. Uma patricia megahairalisadocaradegalisteushoppingeldorado falou mais grosso que deputada cassada por sair dando tiro em preto nos jardins. No caso da Jovem Klan, Paola tem duplamente razão: quem trabalha e cacareja na rádio e na tv panificadora de golpe, é burro e escroto. Ou burra e escrota. Ou burre e escrote. Ou burr e escrot…# Uma cena apóscalíptica não muito distante da nossa distopia bananeira: tarcísio e luciano huck, antes de assinar a privatização da USP (onde papai e mamãe huck deram aula e onde menino lu estudou) e de terceirizarem absolutamente todos os serviços públicos, passam a tropa em revista. A tropa acende uma fogueira e todos fazem aquele sinal que todos sabem que é nazista mas só a jovem pan e a folha dizem que é um sinal levemente semelhante ao dos nazistas. A cerimônia tem uma oração celebrada pelo rabino Natan Himmlerniahu. Enquanto a fogueira arde, a bandeira de Israel é içada ao lado do pavilhão paulista. # tá dificil # Meu amigo Allan Sieber, sei lá quanto tempo atrás, desenhou e escreveu uma história fantástica: Hitler estava vivo e morando no Leblon. Acho que agora ele anda passando uma temporada em São Paulo também. Em Higienópolis, num daqueles prédios incríveis e absolutamente lindos que os arquitetos judeus que fugiram do nazismo, construíram por aqui nos anos 50.# ontem, hoje e sempre, ioiô # A maratona terminou com Testamento, o último filme do Denys Arcand, que finalmente chegou no istrimingui. Eu já tinha dito aqui na Corda que o filme era uma maravilha, mesmo não tendo visto nada, mas filme do Arcand é como disco do João Gilberto: Sempre é bom. Mais uma vez, a sincronicidade, santo Jung que estais no céu: um velho conformado e desiludido com os rumos da civilização ocidental, que não compreende os novos livros, os novos filmes, as novas músicas e as pessoas cheias de tatuagem. É aquele homem branco, de educação clássica, humanista, ciente dos valores da democracia, que aprendeu com a mãe que a vida não é nada mais do que uma passagem sofrida por um vale de lágrimas. Ele mora num asilo- horrível para os padrões canadenses- no Brasil serviria perfeitamente para os ricos depositarem seus pais. E o que parece ser uma história pacata de um homem comum, se transforma num embate (sem que este homem comum queira participar) contra todas as forças que ele não compreende e nem imagina por que aquelas jovens brancas que se passam por indígenas estão lutando. Arcand põe no chinelo e no ridículo os exageros de todos os ismos da contemporaneidade, ismos que no fim das contas, se recusam a fazer a única coisa que precisa ser feita: enfrentar o neoliberalismo. A crítica chiou. Eu gostei pra caralho. E ainda tem final feliz, com redenção, esperança e, sim, um pouco de resignação. Como a minha, que amanhã, no feriado de Tiradentes (alguém lembrou dele?) vou ter que levar os guris no cinema. Pra ver Minecraft. E é certo, vou gostar da empreitada. Na Corda Bamba edição #149 de páscoa 2025, com a retumbante playlist #120 está na rede. Quem tiver um qualquer sobrando, pode assinar o blog nos botões vermelhos comunistas ali de baixo. Quem tiver com um qualquer sobrando, pode fazer um pix de qualquer valor para a chave fabpmaciel@gmail.com Paz! Chocolates! Ioiô da Coca-cola e… Saravá!

LINKS! LINKS! E MAIS LINKS!

Meu amigo Tagore desfruta sua Páscoa no Rosa lendo Tagore:

triângulo da tristeza:

o quarto do lado:

bernard herrmann fala:

dublinenses de james joyce:

os vivos e os mortos, legendado, a despedida de john huston:

o pagador de promessas, completo:

o pavilhão de osaka, projeto de márcio kogan:

e o pavilhão por fora feia viola:

hitler no leblon:

o testamento:

na playlist #120!

abre e fecha com a missa dos quilombos do milton. e tem o personal jesus da nina hagen, o almoço do belchior, o kamikaze do zé ramalho, a nova do lô borges. tem disco novo do tom yorke e tem a yeule dizendo que garotas evangélicas são uma arma. esta semana gilberto gil lançou um desafio nas redes: se você tivesse que escolher apenas dois discos brasileiros pra levar pruma ilha deserta, quais seriam? os meus: o branco do joão gilberto e o força bruta do jorge ben. meu novo amigo de infância (ele ainda não sabe disto) o manoel filho (dica da kamille viola) colocou o jamelão cantando lupicínio. meu chapa pernambucano armando lobo colocou construção do chico e matita perê do tom jobim. todos estes estão na playlist junto com mais um monte de coisa bacanuda. atenção pra dica do luis marcelo mendes, que passa a páscoa num mato com cachorro em secretário, dub pistols! atenção em armandinho, di menor, mandando um bandolim choroso no hit molambo da jovem guarda. atenção em frank zappa e em horace silver. atenção em ajda. louvação em clara nunes. e muita, mas muita atenção em joshua idehem, também dica do meu amigo luis marcelo mendes. leiam a letra e jogem no gugol pra traduzir:

The world according to your mum doing the washing
Capitalism: Your mum washes does the washing
You pay her a dollar. You get her to do your mates washing
Your mate pays you 50 dollars
Communism: Your mum does the washing. You do the washing
Every night you salute a picture of your dad
Socialism: Your mum does the washing. You do the cooking
Everyone is happy in theory
Feudalism:Your mum does the washing and pays you tax
Colonialism:You barge into mum’s room
Claim you “discovered” her room
Dump all your dirty clothes on the floor
Fascism:Your mum does the washing and
You are obsessed with her nose
Liberalism:You watch your mum do the
Washing and feel really really bad
“Something must be done” you say
Something may or may not get done
Libertarianism: Your mum does the washing
You believe you did the washing
Religion: Your mum does the washing. You thank god=
Atheism: Your mum does the washing
You make a twelve part
YouTube video demanding peer reviewed evidence she did
In fact, do the washing
Zionism: You shoved your mum
Into the washing machine
And the spinning made her dizzy
And the dizziness made her vomit
And you point at the vomit and call it antisemitism
Americanism: Your mum does the washing
It’s in the constitution. END OF DISCUSSION
Mansplaining: Your mum does the washing
You tell her how best to do the washing
You have never done the washing
Same Sex Marriage: Your mums do the washing
Patriarchy: Your mum doesn’t exist
The washing is mysteriously done
Terfism: Your mum doesn’t want your other mum
Doing the washing because of, like, genitals and stuff
Polling: There’s a 70% chance you will
Do your washing on Saturday night
Come Sunday morning it was 100% done by your mum
Africanism: You go to Benny’s house. Benny’s mum does the washing
You ask your mum why she doesn’t do the washing
You do not survive the night
Feminism: Your mum insists you grow up
And do your own washing
White feminism: Your mum hired a woman
Of colour to do the washing
Male feminism:That one time I did the
Washing I told everybody I did the washing
I blogged about it, bragged about it
Took a selfie, Insta story. went on TV, won an Oscar
Went on fortnite, did a dance. I’m an ally. Hashtag me too
Egalitarianism: That one time you did the washing is proof
It’s all equal and no one needs feminism any more
Hip Hop: Everyday I’m hustling. Every day I’m hustling
When I bring the basket, mama puts the washing in
Narcissism: You look good in the clothes your mum washed
Surrealism: The washing does your mum

adja

e a playlist # 120!

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